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Sobre haters, likes e rebanhos

Anda por aí muita gente, grupo, comunidade e seita que se dedica quase em exclusivo a estudar quem seguir – e quem criticar. Não aquela crítica mais pró infantil ou invejosa, que vem dos tempos da primária (a “Maria” está mais gorda, não fales com ele que ele não lava os pés, a outra foi encornada e é bem feita para não ter a mania…). Refiro-me à crítica relativa à necessidade de carneirada e aos que, pasme-se, resolvem não a seguir.


Naturalmente que tudo é moda, tudo é passageiro, e que gostos não se discutem… mas o que é cada vez mais óbvio é vermos como há tanta gente que segue forçosamente um caminho – e odeia os que ousam não ir atrás deles. Nesse aspeto o Facebook e os blogs são pródigos a alimentar os haters dos que não são carneiros, dos que se atrevem a seguir outros gostos ou modas, dos que têm a audácia de querer seguir outras carneiradas que não a sua.

- É o caso dos vegans (uhhhh, sou tão mais in por não comer derivados de animais!!) que odeiam tudo o que seja posts e likes sobre hamburguerias – e o oposto também acontece;

- É o caso dos que passam férias no Algarve (uuhhh, sou tão mais in por apoiar a economia local em exclusivo) que repudiam quem escolha – e possa – ir até ao Brasil ou Caraíbas – e o oposto também acontece;

- São as mães a tempo inteiro (uuhhh, que eu é que gosto dos meus filhos por estar em casa com eles 24/7!) que odeiam as que atualizam o seu status devido a uma qualquer promoção laboral – e o oposto também acontece;

- São os fanáticos de cinema (uuhhhh, que eu é que sou um autêntico intelectual!) que repugnam quem desconhece a filmografia completa de Klaus Kinski – e o oposto também acontece;

- Etc etc


E depois, há também aquelas correntes de posts e reportagens e notícias com o objetivo de manipularem as ideias dos que ainda não se converteram à sua opinião – ou seita. Numa coincidência estranhíssima, e sem que nada o faça prever, mil e um sites (ou redes sociais) desatam a partilhar (com um marketing demasiado agressivo para passar despercebido) comentários ou temas ou eventos dedicados a:

- 7 razões para o seu filho brincar descalço na rua, ao nascer do sol
- alimentos amarelos que desintoxicam o organismo em menos de 18h
- como visualizar a sua própria aura em 5 passos
- 32 livros indonésios que deve ler até ao final do mês
- Cultura vintage – você está in ou out?

E ai de quem não apoiar fervorosamente estas causas ou gritar um “basta!” contra, p.ex., todos os que preferem mais os alimentos vermelhos, ou os que nem acham assim taaaanta piada aos tascos gourmet que vendem 4gr de carne ao preço de 1kg da melhor vazia, só porque tem as ementas escritas numa ardósia fingida e pregada no meio de uma parede mal estucada “para dar aquele aspeto de construção envelhecida”.

O melhor de tudo é que, se nos atrevemos a colocar um like num post destes (porque até achámos piada, ou porque até nos identificámos com a escrita do autor), os algoritmos do Facebook e do Google reorganizam-se de tal forma que passamos a receber, diariamente, inúmeras propostas de páginas e autores similares, como se a nossa vida se resumisse àquele clicar de botão, singelo e inocente. Assim como se, por acaso, até indicamos que vamos ao “13º Encontro dos visitantes de tascas que servem aguardente no Baixo Alentejo”, é um ver se te avias até recebermos mil e uma mensagens dos membros do “Água é para beber, Álcool é para morrer”, indignados com a nossa “escolha” para o fim-de-semana e para a vida!

Sim, grupos sempre houve e sempre vai haver. Seitas idem idem, rebanhos aspas aspas. Mas o que agora há, também, é uma promoção cada vez mais exaustiva do “se não estás comigo, estás contra mim”, das “ideologias diferentes e alternativas”, que no fundo querem é ser seguidas por todos. Para que as suas ideias sejam defendidas pelo maior número de pessoas possível (uma questão de insegurança, portanto), e para que o diferente fique igual ao resto que já existe.

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